Por que vocês vêem o meu jeito de amar e viver sob os jargões de psicologia? Há de existir um problema, um trauma ou uma ferida para uma mulher não querer partilhar sua cama com o mesmo homem por toda sua vida? Seria ela necessariamente promíscua ou desiludida? Aplicar-se-ia à ela, de fato, (e não por costume de dizer), o famoso "isso é porque você não achou a pessoa certa ainda"? Esse quase ditado já tem, a meu ver, premissas erradas. Se somos seres cotidianamente modificáveis, haverá uma única pessoa capaz de nos fazer feliz? Preciso crachar uma relação com algum nome para ter permissão de amar? Eu amo. É plenamente óbvia a constatação de que podemos ter diversos amigos, cada um deles nos proporcionando felicidade no seu bocado, da sua forma, no seu momento. Ainda que a todos eles se ame, certos dias se está mais para um, certos dias, mais para o outro, e não necessariamente se há de excluir ninguém do grêmio. Não abdicaria de qualquer dos meus amigos e das múltiplas formas de alegria que me proporcionam em sua conjunção por apenas um deles. Agora pergunto eu: por que um só amor? Em uma palavra peço que me diga para que apertar o gatilho da multiplicidade do seu eu, da variedade do seu gostar? Família é a única resposta plausível. Porque se pode amar, sem casar. Porque se pode fazer amor, sem casar. Fomos educados a ver no casamento um momento natural da vida, como comer ou dormir. E não o questionamos por muito tempo, mas sabemos que há dias sem sono e dias sem fome. Pelo tempo em que pretensamente essa tal monogamia consagrada em cruz e em pena deu certo, permaneciam as mulheres quietas, as roupas lavadas e a empregada de casa comida. Não acho que um casamento não possa ser bem sucedido, mas me nego a afirmar que o sucesso de um casamento garanta a forma mais plena de felicidade. Creio ainda que ele é um placebo para a solidão. As pessoas têm medo de morrer sozinhas, porque não foram acostumadas a ver em si o bastante. Apegam-se a relacionamentos sem sentido, para poder dizer, para poderem sentir-se seguras e amparadas. Amar alguém se basta em si. Ao menos deveria. Ninguém precisa se postar na frente de duzentas pessoas e mais um padre - que sequer sabe sobre os prazeres e desprazeres daquilo que abençoa - para garantir um amor eterno. Não nasci para eternizar nada que é mutável. E se isto fosse possível: achar em outrem o amplo espectro de possibilidades que me saciaria o ser (fosse esse oposto tão e no mesmo quantum passível de renovação contínua), amaria por mim e mais ninguém. Egoísta seria, ao fim, igualmente, então. Melhor por si do que por só, não?