Depois de muito tempo, tive uma reação não reagida. Dei razão a muitas pessoas que eu condenava e não entendia. Na verdade, não lhes dei razão, porque elas também não tinham. Explico-me. Entendi que o corpo às vezes reage, de forma condicionada a pedaços de história, a pequenos traumas, que nós não sabemos existir. Como um ato reflexo. O martelo bate no cérebro e ele impulsiona algo que você não pode prever. E, frente ao desconhecido, a reação causa estranheza. Não é justificação para atos imbecis. São atos imbecis sem justificação. E há pessoas que despertam isso na gente. As grandes epifanias surgem de contextos inesperados, de indivíduos passantes, de pessoas fora do seu círculo ordinário de vivência. Dentro da sua casa é que você não vê a mancha na parede. É assim para mim, não é para você? Queria saber se falo de algo comum. Enfim, sempre precisei ter o controle de tudo, ainda que não percebesse. Foi ali que me toquei, após um comentário banal, desses de meio de goles. Tenho um enorme medo de avião. Odeio mudanças. Não me apaixono fácil. Se olhar bem o todo a razão de tudo isso é só uma: gosto de tomar as rédeas e não saber ou poder definir sozinha o próximo passo me dilacera. Diante desta descoberta, recrudesci. Com minha fragilidade à toa, me sentia nua, como se ele tivesse me despido. Era um conceito imbricado, uma verdade falsa, mas construída em concreto sólido que acabara de ser bombardeada com um peteleco. Perdi o Controle. E não ter controle sobre minhas reações diante de alguém - e pior - de mim me deixou totalmente desconsertada. Assustei-me de fato com a minha mente. Talvez eu fosse programada a não deixar as coisas acontecerem, desde aquele evento (desnecessário de lembrar). Era defesa, medo, não importa, fato é que meu corpo deu seu sinal de que uma marca ficara. De fato, sexo havia se tornado algo apenas biologicamente condicionado. Saí correndo das mesmas cenas, sem perceber que agora compunham outra história. E fiquei lá sem sentidos, mas com muitos questionamentos. Ele me provocou isso e, de forma coerente com as minhas elucubrações instantâneas, não era alguém do meu convívio. Também não fazia força alguma para me tirar dos meus eixos. Era uma coisa sinérgica, sei lá, que ele nem percebia. Ali exposta, à flor da pele me coloquei, com a missão de desconstruir impressões iniciais, mas as reconstruí, no fim, com peças mais resistentes. Se me achava estranha, fez-se a certeza de eu sê-lo. Eu não era nada daquilo, mas era só o que conseguia achar em mim, para expor naquela situação desconfortante de deficiências ansiosas e imprevisíveis por uma chance de aflorarem. Queria mostrar quem eu era, como era, o que pensava. Mas por quê? Não devia isso para ele. Mas devia para mim, talvez. Contudo, diante daquele amontoado de falhas, eu não sabia mais o que mostrar. Me senti uma menina de dezesseis anos tentando parecer adulta e mulher feita para um homem que lhe oferece um conselho maduro. Petulante, não sabe nem como se compõe o caráter, que talvez nem tenha se firmado. Meu cérebro, ao agir em direção ao meu encontro, fez-me sair dali. E não achou nada, no lugar onde me levou. Eu parei sem ir adiante e sem poder voltar. E nesta hora, o pensar não me dirigia nem intencionalmente nem por ato não involuntário. Relembrei que já tinha o primeiro sinal da desestruturação possível, no defronte inicial. Mas, na ocasião, havia outros fatores e achava que esses, com a exatidão química da conturbação mental que causam, explicavam muita coisa. Foi, inclusive, em busca de me revelar, mostrar algo mais do que flashes conturbados, a razão que me fez ir ali. Não consegui, todavia, estar ali como eu queria. Postada eu estava, sem saber o que fazer. Depois de muito pensar, encontrei alguma explicação, que não obstante árdua conquista, ainda não me satisfaz. Ele me deixava à flor da pele. Infelizmente, era só isso que conclui. Mas isso não responde nada. Eu queria saber por quê. Por que havia eu de ser tudo ou nada. Não sou correta ou torpe. A conjunção adversativa encaixada com alternâncias temporais dos adjetivos sempre me pareceu mais adequada a mim e, aliás, a todas as pessoas. Perdoe-me Maquiavel. Mas diante dele um dos atributos se encaixava a mim, afastando toda e qualquer outra combinação. Viva Maquiavel. E assim que eu me fiz de "A" torpe. Foi como torpe que entrei ali e que saí de lá. Nem senti as palavras soarem, ou meus pés andarem. Corri dali perdida, desencaixada. E, quando a racionalidade me veio, me perguntei: por quê? Eu realmente não sabia, mas não me dei a humildade de dizer que não tinha a menor ideia do que senti. Conjecturei razões de sentimento, mas não era isso. Pela primeira vez, não tinha a mais vaga noção e nem pude prever esta estranha reação. O que mais faria? Decifrava-me, enquanto ele expunha-me a minha loucura, fazendo os mesmos questionamentos que eu me fazia. Natural que eu soubesse o que o meu próprio eu determinava. Me senti refém de mim mesma, ao não ter respostas coerentes. E a ânsia por se findar o vazio de sua arguição razoada, fez-me dizer retalhos. Cacei palavras soltas que meu cérebro lançava em sinal de urgência, como num erro de programa já antevisto e cuidado. Peguei algumas expressões naquele apanhado. Não faziam sentido, contudo. Saí dali e não dormi. Voltei sem conseguir explicar para mim o que tinha acontecido. A loucura que fui refutar, ratifiquei-a com atestado técnico. Perda de Controle, eu tinha perdido meu controle. Mas, fui avisada por grafias divinas. Como inciais podiam fazer tanto sentido...